Desde o dia 17 de abril, o munícipe que vai até o gabinete da presidência da Câmara Municipal se depara com uma funcionária baixa, de olhos puxados, meiga, enérgica e extrovertida. É a menor aprendiz Ana Caiari Ferreira, aluna da ACORDE e Patrulheiros, de 26 anos, conhecida como Tita, que se apresenta como assessora do presidente do Legislativo, vereador Júlio Cesar, que contagia o corredor da Câmara sem ter vergonha de atender quem quer que seja pedindo informação.
Tita é o primeiro fruto da nova lei da Câmara Municipal que amplia inclusão de pessoas com deficiência nos serviços públicos, aprovada pelos vereadores início do ano.
A menor aprendiz é portadora da Síndrome de Down, mas nem por isso a imperfeição genética impede de trabalhar e fazer o que mais gosta: amizades: “Eu gosto de trabalhar aqui, porque eu tenho bastantes amigos, como a Fabrícia, a Su, o Bruno, o Rodrigo, o Júlio (vereador), um monte de gente”, disse com um sorriso gracioso.
De acordo com o Ministério da Saúde é comum portadores de Síndrome de Down ter algumas características diferentes, como hipotonia: diminuição do tônus muscular responsável pela língua protusa, dificuldades motoras, atraso na articulação da fala, cardiopatias e deficiência intelectual. Mas a menor aprendiz tem superado algumas delas.
Na Câmara Municipal a tarefa de Tita é administrativa. Recepciona e orienta qualquer cidadão que entra no gabinete da presidência solicitando ajuda. Tem a sua própria mesa e tudo que acha importante anota em uma caderneta sob orientação da amiga Fabrícia Sousa.
Na sessão do dia 26 de abril o vereador Júlio Cesar chamou Tita no final da sessão e diante da população presente e das câmeras anunciou que Câmara Municipal tinha alterado a lei em relação ao menor aprendiz e estagiários, abrindo oportunidade de inclusão. “Pode parecer coisas pequenas, mas eu fico muito feliz e tenho certeza que todos os vereadores ficaram também. Vocês vão ver ela muito pelos corredores, ela diz que é minha assessora, mas é da Casa e tenho certeza que vai nos ensinar muito”, declarou.
Tita é natural de São Paulo e é quarta filha da família. Quando veio ao mundo precocemente, logo a mãe percebeu que daria a luz a uma criança especial que deveria oferecer carinho redobrado, que aumenta com o passar dos anos. “O cuidado foi maior porque a Tita nasceu com sete meses. Mas ela é tão carinhosa e muito afetuosa, muito especial para gente que o carinho aumenta a cada dia que passa”, disse a mãe Ana Maria Ferreira.
O apelido foi dado pela família no primeiro ano de vida. Tita queria engatinhar e os irmãos ficavam tentando segurar ela na parede e surgiu a semelhança de Lagartixa. Com a junção de Tica (pequeninha) e Tixa (de lagartixa) resultou em Tita e ela faz questão que a chame pelo apelido.
É o primeiro registro em carteira de Tita, mas não é o primeiro trabalho. Ela já trabalhou de recreador Infantil em festas de escolas- a mãe era o personagem paçoquinha e ela a pipoquinha. Também, no Carnaval de Olinda (Recife)-onde a família já morou- ela trabalhou vendendo água e refrigerante com o irmão Inaê.
A família contou que desde que começou a trabalhar na Câmara, Tita tem demonstrado mais responsabilidade e preocupação com pontualidade e admitiu que criança como ela precisa de estímulo para progredir intelectualmente. “Acho fantástico porque ela está muito feliz”, disse o irmão Inaê Ferreira Domingues.
“Tita precisa desse estímulo para desenvolver. Muitas vezes a família mima de mais, cuida de mais e não criar oportunidade para o desenvolvimento. Trabalhar na Câmara está forçando ela se desenvolver e creio que inclusão social permite que ela progrida e alcance novos estágios na vida”, acrescentou.
A única incógnita no momento para Tita é com relação ao futuro. Disse que não está nos plano do momento estudar, só trabalhar. “Eu sonho trabalhar na Acorde, talvez ser professora”, finalizou.
(Abner Amiel/ Folha São Carlos e Região)
Foto: Abner Amiel/ Folha São Carlos e Região